Tuesday, March 4, 2008

o velho que tudo sabe

De olhos nebulosos postos na prata que cobria a ria, o velho deixava queimar entre os dedos um cigarro que a tempos levava aos lábios. O final daquela tarde transpirava tempo quente e húmido que só o Levante traz. No céu, gaivotas gritavam umas com as outras como se de comadres se tratassem. O resto de sol que se escondia a poente pintava o céu já azul-escuro com lâminas de laranja vivo.

Aproximo-me. Encosto-me aos ferros que ladeiam o porto e ali fico. Lado a lado. Pergunto-lhe quando acabará o Levante. Olha-me de soslaio e pede-me um cigarro que saco do maço e lhe passo para as mãos. Tira do casaco de xadrez roçado uma caixa de fósforos grande com marcas de gordura. Puxa então de um e fá-lo roçar na lixa, acendendo-o à segunda. A sua mão de pele encarquilhada e enegrecida pelo tempo transforma-se em concha protegendo o fogo que acende o cigarro. Puxa grandes tragos, exalando o fumo pelas narinas.

Diz-me então que acabará amanhã ou daqui a mais três dias. Pergunto-lhe como sabe. Explica-me que foi assim que o pai o ensinou, que nunca lhe perguntou o porquê. É assim e mais nada.
Afasto-me e sinto que me basta esta explicação. Que ainda haja coisas que não se expliquem.

i am you

2 comments:

Anonymous said...

O porquê não passa de uma palavra, por vezes cómoda, por vezes incomodativa. Quando ela deixa de fazer sentido ou assumir qualquer importância....aí sim...podemos seguir. Mesmo sem explicação. Apenas seguir...

Beijo

Seamoon said...

não se explicam mesmo....

;)
jinho